Procurador de coisas

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

É PRECISO SABER VIVER

Doença crônica intestinal. Não adianta explicar o que é isso pra quem não sente. Não adianta pedir pra multiplicar uma dor de barriga por mil, não adianta dizer que a dor é igual à do parto, não adianta dizer nada. As DIIs transcendem a dor e as complicações e afetam todo o lado social. Quantas vezes rejeitamos convites para lugares mesmo perto? Quantas vezes cedemos ao esforço de comparecer em eventos sociais tendo que sair mais cedo depois de ter suportado o quanto se pôde? 

Eu tenho retocolite e, assim como meus irmãos de sofrimento social, já sofremos muitas privações e prejuízos. Já me custou sair de uma faculdade e me tirou de um emprego depois de oito anos. Custar é a palavra exata quando falamos em dinheiro. Remédios caros, consultas caras... 

Tempos atrás, me questionei: até que ponto a retocolite iria me atrapalhar? Que limites iria me impôr? Sim, porque na empresa eu fiquei travado como funcionário. Vivia doente e esse tipo de coisa engessa qualquer possibilidade de crescimento. Na faculdade, eu perdia aulas, faltava semanas. 

Mesmo eu olhando em volta e vendo outros crônicos intestinais vivendo suas vidas, crescendo profissionalmente, concluindo seus cursos, isso não me inspirava, não me animava. Como sempre achei que cada um tem a sua medida, fixei que o meu sofrimento não me permitia ir adiante. Por outro lado, sempre achei que a vida, o tempo todo, nos apresenta uma balança na qual devemos pesar o que vale e o que não vale a pena. Mesmo não estando lá muito bem, passei a me dedicar ao estudo para o concurso da Caixa Econômica. Dedicação recompensada. Passei em 35° na minha região, fui convocado três meses depois de fazer a prova e já passei pelo processo de admissão.

Escrevo esse post por duas razões. Primeiro, pra mostrar que eu olhava mais pras minhas restrições do que pras minhas capacidades. É claro que somos limitados em alguns momentos, mas em outros podemos dar o máximo de nós pra que a vida melhore. Segundo, pra dizer que é possível fazer acontecer como qualquer outra pessoa sem DII, que aliás, tem outros problemas crônicos restritivos como o nosso. Melhor ainda, ouvimos tantos incentivos de que é possível dos amigos que nos cercam e não nos compreendem que sequer agimos (ou reagimos) pra dar razão da nossa "fraqueza", mas quem conseguiu uma grande conquista (pra mim é) foi alguém que sofre tanto quanto muitos portadores de retocolite, crohn, síndrome do cólon irritável e outras mazelas do trato digestivo.

É uma merda ter que ir ao banheiro 10, 15, 20 vezes ao dia, sentir dores capazes de nos fazer pedir pra morrer. Uma crise debilita o corpo, a alma, o espírito e derruba até algumas convicções. Eu não via nos outros um exemplo suficiente pra me animar. Precisei ter meu momento, minha situação pra me impulsionar a conquistar essa vaga.

Não quero só compartilhar a alegria de ser um empregado público federal. Aliás, esse é um primeiro passo. Quero mostrar que eu, que sempre desacreditei nas boas possibilidades, consegui e, por isso, acredito que todos podemos, cada um no seu objetivo. Com um pouco de incentivo, dedicação e uma boa dose de enfrentamento, a gente pode. Sem positivismo, mas com ação, com iniciativa. Não façamos da nossa vida um constante sofrimento. Ele apenas faz parte da nossa vida e é preciso ter jogo de cintura pra seguir em frente.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

VALE A PENA

Fundamental é acreditarmos na nossa capacidade. Eu discordo quando dizem que somos capazes de tudo. Pelo menos não em condições normais. Eu, por exemplo, não sei vender. Aí me falam que, na hora do aperto, eu acabo aprendendo. Mas assim não conta, não é? Fosse assim, eu diria: então vai lá e come raiz de árvore, bebe água suja e come urubu cru. Pois é, fosse na guerra ou em uma grande tragédia, isso seria possível, ou não?

Mas, falando de situações comuns, somos, sim, capazes de desenvolver coisas dentro daquilo que nossas aptidões  permitem.  Nisso, precisamos ter a perfeita noção do que podemos mais ou menos. Eu adoro escrever, adoro música, tecnologia, computador...  Mas pra falar a verdade, eu não tinha essa noção antes, ou, se tinha, a preguiça de reagir a tudo imperava. Aí, entram em cena peças fundamentais pra que nossa vida vá pra frente: os amigos.

Amigos são bons pra isso. E amigo é um termo geral, pois ele pode estar embutido em um namorado, numa esposa, nos pais, enfim, não precisa ser o que chamamos de amigo que se diferencia de parente. Independente de quem seja o amigo, é preciso que se saiba que, embora toda ajuda seja incondicional, os resultados são fundamentais. Se alguém faz coisas por mim e eu não mostro meu esforço, aos poucos essa pessoa vai desistindo de mim. Pode nunca deixar de gostar de mim, de me amar, mas acredito que não aproveitar todo apoio recebido é desconsiderar a ajuda e minimizar a condição de amigo.

Como eu disse, não acreditava muito em mim e foi por causa dos amigos que obtive algumas conquistas. A gente aprende muita coisa e uma delas é que não estamos prontos pra tomar todas as decisões sozinhos. Essa autonomia é ilusória em muitos pontos. Claro que tem coisas que eu mesmo decido, mas prefiro fazer meus amigos participarem das minhas escolhas. É uma questão de quebra de orgulho também e isso independe de idade. Sim, porque quem é mais velho acaba se achando no direito de "impor" sua experiência.

Conheço pessoas que foram ajudadas antes e agora não são mais. Motivo? Sempre fez o que quis ou achava que as pessoas se metiam de mais na vida delas. Resultado? Bem... o resultado é terem a vida que escolheram. 

Eu estou convicto que não me esforcei e nem me esforço o suficiente pra melhorar o quanto eu queria. Existe um pequeno abismo entre o que quero e a força pra mudar as coisas. Esse abismo aumenta porque a idade restringe, a gente perde a paciência pra muitas coisas, outras responsabilidades se criam, outras prioridades aparecem e, conforme desperdiçamos as chances, muitas preciosas, os amigos desistem da gente.

Outra lição aprendida está aí. Mostrar interesse, esforçar-se e valorizar o seu próprio esforço e toda ajuda recebida. Assim, os amigos sempre nos apoiarão. E, obviamente, reciprocidade com isso. Nada de só receber. Há que se procurar ajudar sempre. Aliás, isso é gratificante quando os resultados aparecem. Porém, não sei com os outros, mas é frustrante quando toda ajuda dispensada vai pelo ralo.  Na minha juventude (já posso falar assim?) desperdicei tantas chances que me deixariam numa "zona de conforto" e me arrependo. O problema é que arrependimento não volta o tempo. Claro que uma mudança de atitude faz diferença.  E muita. Mas quanto mais o tempo passa, mais fica a sensação de fracasso e na balança da vida isso dói um pouquinho. 

Eu espero corresponder a ajuda dos meus amigos, assim como seguir ajudando as pessoas que amo. Espero não decepcionar nem sofrer decepção. Devemos lembrar que quando recebemos ajuda, apoio, as pessoas estão dizendo: você vale a pena!